Um paradoxo saliente da vida contemporânea opõe um cuidado crescente com a alimentação saudável à prevalência progressiva do sobrepeso e da obesidade entre nós. A obsessão com as dietas tem mais a ver com os sintomas do que com o enfrentamento da moléstia do século 21.
Salvo cada vez mais raras exceções, como os 5 milhões de famintos que sobrevivem hoje no Sudão do Sul, a desnutrição vai deixando de ser uma chaga mundial. Em contrapartida, avolumam-se os problemas de saúde trazidos pelo excesso de peso.
Aqui no Brasil, mais da metade (53,9%) da população ultrapassa o peso ideal. Essa condição a predispõe a disfunções crônicas como hipertensão e diabetes e, em consequência, à morte prematura por doenças cardiovasculares.
Proporção similar afeta os clientes de planos de saúde, entre os quais 35,3% têm sobrepeso e 17% são obesos —vale dizer, apresentam índice de massa corporal (IMC, peso dividido pelo quadrado da altura) entre 25 e 30 e, respectivamente, igual ou superior a 30.
Pior: nos dois casos crescem os contingentes dos que acumulam mais massa do que o desejável.
Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que 39% da população adulta do mundo está acima do peso, e 13%, obesa. Em certo sentido, pode-se dizer que estamos diante de uma pandemia.
As razões são comuns e conhecidas: sedentarismo e alimentação inadequada, decorrente do acesso ampliado a alimentos industrializados, que levam mais açúcar e gordura em seu processamento do que refeições preparadas com ingredientes in natura.
A essa tendência se contrapõe uma preocupação indiscriminada, e um tanto inócua, com as virtudes sanitárias dos alimentos. Proliferam as modas orgânicas e naturais, assim como as interdições —que vitimaram, em sucessão, a manteiga, o açúcar refinado, os ovos, o glúten, a lactose.
A devoção à dieta, no entanto, não se confunde com boa educação alimentar. Esta começa em casa e deve continuar na escola; ao sistema público e aos planos privados de saúde cabe elevar a oferta de programas de prevenção das doenças crônicas associadas ao sobrepeso e à obesidade.
Vídeo: Escola de comer de Paraty – alimentação escolar de qualidade
No cotidiano, pode-se recordar a tríade minimalista de conselhos do norte-americano Michael Pollan, autor de “O Dilema do Onívoro”: coma comida, não muita, de preferência vegetais. Em outras palavras, usar o bom senso e buscar uma alimentação nutritiva, simples e variada.
Postado originalmente no jornal Folha de São Paulo.
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