Para compartilhar entre si os desafios e oportunidades para o equilíbrio fiscal e, também, fomentar o debate acerca do Pacto Federativo, a Comunitas reuniu, na última sexta-feira (18), diversos secretários municipais e especialistas, durante mais um Encontro Rede Juntos.
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Dessa vez, a reunião foi realizada em parceria com a Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), organização que, assim como a Comunitas, tem foco em questões municipalistas e maior fortalecimento e empoderamento para as cidades.
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Na abertura do encontro, o presidente da FNP e prefeito de Campinas (SP), Jonas Donizette, explicou sobre a Carta de Niterói, desenvolvida com apoio da Comunitas, direcionada aos atuais pré-candidatos à presidência do Brasil. O documento elenca temas prioritários – como Saúde, Educação, Segurança e Emprego – sob o ponto de vista do Pacto Federativo. A proposta é que, caso eleito, o próximo presidente realize ações compartilhadas entre União, estados e municípios.
Precisamos debater um novo Pacto Federativo, para que possamos transformar a realidade dos municípios brasileiros, sobrecarregados de responsabilidade e no limite do orçamento. Não podemos tirar a agilidade do município e a autonomia para decidir sobre seu orçamento
Jonas Donizette
Confira o vídeo e entenda:
Pacto Federativo e reforma tributária
Na primeira roda, Guilherme Mercês, economista-chefe do Sistema FIRJAN (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro), e Fernando Rezende, economista e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), reuniram-se para debater a reforma tributária e o Pacto Federativo – conjunto de regras sobre competências e responsabilidades dos entes da Federação.
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Guilherme demonstrou a restrição orçamentária das prefeituras brasileiras, refletidas nos dados do último Índice Firjan de Gestão Fiscal (IFGF), que mostrou que 86% dos municípios brasileiros estão em situação fiscal difícil ou crítica.
Ainda segundo o mapa da crise, o problema fiscal é estrutural, com, por exemplo, cada vez menos espaço para investimentos no orçamento municipal, gestões que possuem alto comprometimento do orçamento com despesas obrigatórias, e restos a pagar que se tornam a forma tradicional de financiamento.
“Impressionantes 82% dos municípios não geram nem 20% de suas receitas, o que representa uma dependência crônica das transferências estaduais e federais. A capacidade de receita própria diz muito sobre o tamanho do município: quanto mais cresce, tem menos dependência e mais capacidade de se manter”, explicou o economista.
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Para Fernando, o ponto fundamental é quanto à alocação dos recursos municipais que, segundo ele, não necessariamente guarda relação com o tamanho e o perfil das demandas, pois a dinâmica socioeconômica da população não se ajustou à rigidez das regras de repartição dos recursos e às interferências do governo em relação à alocação desses recursos.
Ele citou como exemplo um hipotético pequeno município que não possui mais estudantes – pois deslocaram-se para cidade, porém mantém a obrigação de aplicar 25% do orçamento em educação, ao invés de ter a possibilidade de realocar esse investimento para a saúde, já que na cidade ficou apenas idosos que dependem do sistema.
“Atualmente, o ambiente é hostil e dificulta a realização de uma boa gestão fiscal. Não somente pelos desequilíbrios fiscais que se acumularam, mas, também, pela falta de autonomia para os municípios de decidirem onde vão aplicar o dinheiro”, considerou o professor.
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Desafios para o equilíbrio fiscal
A segundo roda teve entre os assuntos as Leis de Responsabilidade Fiscal (LRF) municipais, fundo de royalties e política orçamentária, e contou com a participação de Caio Megale, secretário de Fazenda da Prefeitura de São Paulo (SP), Giovanna Victer, secretária de Planejamento da Prefeitura de Niterói (RJ), Paulo Souto, secretário de Fazenda da Prefeitura de Salvador (BA), e Breno Lemos, superintendente técnico da Secretaria de Planejamento, Finanças e Orçamento da Prefeitura de Curitiba (PR).
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Giovanna apresentou o trabalho de reestruturação do fundo de recursos que vem dos royalties do petróleo. A iniciativa conta com parceria da Comunitas e visa facilitar a poupança dos excedentes de riqueza produzidos pela renda do petróleo por meio do Fundo de Estabilização da Receita (FER), de forma a garantir a fortuna a longo prazo e a equidade intergeracional, ou seja, que as gerações atuais e futuras se beneficiem, igualmente, das riquezas geradas pelo petróleo.
Segundo a secretária, o desafio agora convencer a sociedade da importância desse trabalho e estimular no cidadão o sentimento de apropriação desse recurso. “Esse recurso não pertence ao governo. Pertence à população atual, aos seus filhos e netos”, disse.
Trazendo o panorama para a maior cidade do país, Caio compartilhou mudanças importantes realizadas na gestão fiscal paulistana, como a revisão da Planta Genérica de Valores; a renegociação da dívida e retomada das operações de crédito; e a redução da sonegação por meio de sistemas, fiscalizações e estímulo à arrecadação; e a revisão de contratos, aluguéis, programas, práticas estabelecidas, cargos comissionados. Para o futuro, estão previstas ações como a reforma da previdência e a criação da Lei de Responsabilidade Fiscal Municipal, além do Programa de Modernização da Administração Tributária.
“Buscamos ações para resolver o desafio da gestão fiscal, mas ainda considero pouco. Realizamos muitas atividades para gerar receitas, e atacamos também as ineficiências da máquina pública, mas tem ações estruturais, mais profundas, que precisam ser realizadas”, ponderou o secretário.
Ex-governador da Bahia e atualmente integrante da equipe de secretários da Prefeitura de Salvador, Paulo Souto concordou com a necessidade da revisão do Pacto Federativo, que faz com que cerca de 68% de todos os tributos arrecadados no país ficam nos cofres da União, e na redistribuição, 57% ficam em Brasília, 25% nos Estados e 18% nos Municípios.
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O secretário compartilhou a situação fiscal de Salvador, que tem uma das menores receita corrente per capita do país e desenvolve ações para sair dessa situação. Segundo ele, no início da gestão a situação encontrada foi de desequilíbrio das contas públicas, instabilidade institucional e fragilidade administrativa.
Para superar o desafio, foram implementadas medidas como a revisão da Planta Genérica de Valores, a implantação do Cadastro Informativo Municipal (CADIN), a implementação do Programa Nota Salvador – que resultou no aumento expressivo dos valores declarados de ISS, e a implantação do resumo de Declaração Tributária (RDT) – que realizada a cobrança direta da diferença entre o ISS Declarado e o Recolhido.
Levando o foco para Curitiba, Breno apresentou as inovações realizadas na LRF municipal, como questões relacionadas às despesas de pessoal – que definiu que a variação total das despesas com pessoal ela tem que ser até 80% da variação nominal da receita corrente líquida; e o limite dos gatilhos de redução de despesas obrigatórias de pessoal – que na LRF curitibana fica de 50%.
Controle de despesas
Com a participação de Paulo Uebel, secretário de Gestão da Prefeitura de São Paulo, Francisco Canindé Alves, secretário de Administração de Teresina (PI), Fúlvio Albertoni, secretário de Fazenda de Juiz de Fora, e Allan Moreira, presidente do Instituto de Gestão Previdenciária do Pará (IGEPREV), a penúltima roda debateu previdência, funcionalismo e custeio público municipal.
Paulo explicou a importância de uma reforma previdenciária para a garantia do funcionamento da máquina pública. O secretário demonstrou os gastos com a folha de pagamento paulistana, que acumulou mais de 120% de aumento, de 2009 a 2017 – tornando-se a maior despesa da gestão municipal.
“Se nós não tivéssemos esse déficit, nós poderíamos dobrar o orçamento de 49 unidades orçamentárias – 16 secretarias, 32 prefeituras regionais e mais o Fundo Municipal da Criança e do Adolescente”, informou.
Ainda de acordo com o secretário, as diretrizes da proposta de reforma previdenciária não mexem com os diretos e não visa reduzir os benefícios dos servidores, mas, sim, criar condições de mais sustentabilidade e avanço para o funcionalismo público.
Já em Teresina, o desafio das despesas – foco da apresentação, é a implantação de metodologia de gerenciamento, brusca de melhorias constantes nos processos, redução de custos e o oferecimento de mais qualidade do serviço público, segundo Francisco.
O secretário demonstrou as ações realizadas pelo programa Gestão Cidadã – que tem parceria da Comunitas. Foram realizadas ações focadas em crescimento de receita, redução de despesas e redesenho de processos. Como resultado, a Receita própria do município aumentou em 6%, de 2013 para 2016, e a meta foi ampliada em 78 milhões em relação ao ciclo anterior. Já na frente de Despesas, o resultado acumulado até fevereiro de 2017 demonstra um ganho de R$ 25,2 milhões. Esse resultado contribuiu, de forma significativa, para o aumento dos serviços à população na área da saúde, em 2016, com a ampliação de 14% no número de leitos hospitalares.
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Na previdência de Juiz de Fora também há necessidade de uma reestruturação ampla e irrestrita do regime, segundo Fúlvio, com foco em sustentabilidade e na desmobilização dos recursos financeiros da previdência para o desenvolvimento das demais políticas públicas.
Segundo o panorama orçamentário e financeiro apresentado pelo secretário, o crescimento das receitas do tesouro municipal não acompanha o crescimento das despesas previdenciárias.
“Mas não é possível fazer isso com as portas da prefeitura fechada. É necessário que a população seja chamada para a discussão e fazê-la entender que essa iniciativa é importante para o cidadão”, expressou.
Do Norte, Allan trouxe os desafios da gestão previdenciária. Segundo os dados apresentados, a taxa de fecundidade caiu 57,7% entre 1980 e 2015, passando de 4,1 para 1,7 filhos nascidos vivos por mulher. Já nos último 35 anos, a esperança de vida ao nascer aumento 12,8 anos. Segundo o presidente do IGEPREV do Pará, aumento da longevidade da população demanda ações específicas para a sustentabilidade da seguridade social.
Mas Allan ponderou: “todo mundo acha que a previdência é a culpada, mas na verdade a previdência é reflexo daquilo que se faz na política de ativos”.
Contribuições para o Pacto Federativo
Para fechar o Encontro Rede Juntos, a última mesa contou com a participação de Alberto Borges, economista editor do Anuário MultiCidades, e Gilberto Perre, secretário-executivo da FNP.
Com dados que mostram que 1.364 dos 5.570 municípios tiveram redução da população, sendo 98,8% desses com menos de 50 mil habitantes, Gilberto explicou a necessidade de uma reformulação do Pacto para dar maior autonomia para as cidades brasileiras.
“Não é necessariamente o número de municípios o nosso maior problema. Não é preciso desconstituir municípios, mas, sim, mudar atribuições. Quanto maior a localidade, mais responsabilidade poderá abarcar”, considerou.
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Para ele, atualmente as atribuições dos municípios são incompatíveis com a capacidade socioeconômica e o financiamento de pequenos municípios não pode estrangular o orçamento das cidades de portes médio e grande.
Alberto concorda, e afirma que, enquanto não entender que as leis que foram criadas há anos atrás precisam de reformulação, não será possível dar estrutura e equiparidade no oferecimento de bons serviços para população que mais necessita.
Confira o depoimento dos participantes do Encontro Rede Juntos sobre Equilíbrio Fiscal:
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