Era cinco horas da manhã, em Nova York, quando o tão esperado consenso em torno da Nova Agenda Urbana foi anunciado por Joan Clos, secretário-geral do Habitat 3, em sua conta no Twitter. Foi por pouco. A conferência, a terceira do Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos, começa no próximo dia 17 em Quito, no Equador, após dois anos de negociação entre governos e entidades representativas do mundo todo. A novidade fica por conta da inclusão do “direito à cidade”. Ainda que de forma tímida, o termo figura pela primeira vez em um acordo entre países da ONU.
Ao contrário do Acordo de Paris – que estabeleceu a missão de limitar a “bem menos de 2ºC” o aumento na temperatura da Terra – a Nova Agenda Urbana não deve trazer metas impositivas aos signatários. O grande legado deve ser a visão de que as cidades devem estar no centro do processo de desenvolvimento. E que a construção de um mundo mais justo depende de cidades feitas para as pessoas.
Não é modo de dizer. A ONU avalia que 70% da população mundial deve morar em áreas urbanas até 2050. A tendência é de cidades cada vez maiores e mais desiguais – e vem daí a importância de uma agenda que vira o rumo para o outro lado.
Atualmente, as cidades já concentram metade da população e 80% do Produto Interno Bruto Mundial. Já o índice de Gini, que mede o quão desigual é um país, passou de 0,65 para 0,70, nos últimos trinta anos (quanto mais perto de zero, mais igualitário).
Em resumo, o documento aprovado em Nova York defende “uma utilização igualitária das cidades e dos assentamentos humanos, buscando a inclusão e garantia de que todos os habitantes, das atuais e futuras gerações, sem nenhum tipo de discriminação, possam habitar e produzir cidades e moradias sustentáveis, resilientes, com preço justo, acessíveis, saudáveis, seguras e justas”.
É nesta parte do texto que entra o “direito à cidade”. Como “o esforço de alguns países e governos locais em captar esta visão” de cidade. Texto tímido, mas comemorado. “É a primeira vez na história que qualquer documento intergovernamental reconhece o conceito, o que irá servir como um instrumento importante nos próximos anos”, escreveu a diretora de assuntos internacionais do Habitat para a Humanidade, Jane Katz, em balanço sobre o tema. Alyssa Fischer, do WRI Ross Center for Sustainable Cities, também exaltou a inclusão do termo, que é “consensual entre os formuladores de política”, embora lamente a vaguidão da coisa.
Para o diretor programático da Fundação Avina (que participa da construção do Habitat com representação da sociedade civil), Oscar Fergutz, há motivo para comemorar. A inclusão “é um pézinho na porta”, consolida “um enfoque inovador, a ideia de consolidar os direitos humanos, de que todos somos iguais perante o planeta”, defende.
Fergutz compara o processo atual ao do Habitat 2, de 1996. Na época, o “direito à moradia” foi a grande polêmica. De lá para cá, estabeleceu-se um consenso mundial de que não basta morar debaixo de um teto se esta moradia não for adequada.
Em Quito, um dos principais desafios deve ser a criação de mecanismos de implementação das orientações aprovadas. Pode ter algum tipo de recomendação para os países, como o monitoramento de estatísticas e o incentivo à criação de planos nacionais e locais para resolver alguns nós. Mobilidade, moradia e transporte são três dos assuntos principais, que devem figurar nestas recomendações.
Brasil
Se em Quito é polêmica, no Brasil o direito à cidade não é nenhuma novidade. O tema guia a legislação e política urbana no país há 15 anos, desde a aprovação do Estatuto das Cidades, em 2001. O país, aliás, é um dos principais responsáveis em “exportar” o conceito para os colegas da ONU.
O que não significa que a aprovação da Nova Agenda Urbana não terá nenhum impacto no país, avalia Oscar Fergutz. “Serve para reforçar que estamos no caminho certo, para mostrar que esta não é política de um governo, mas o caminho que a humanidade está seguindo. Tanto que os pares de fora estão defendendo, os Estados Unidos, o Iraque vão assinar este documento, todos os 149 países da ONU”.
Entidades definem nove áreas de prioridade para Curitiba
Representantes de 34 entidades se reuniram para pensar eixos de desenvolvimento para a Curitiba dos próximos 20 anos. O debate foi na manhã desta quarta-feira (5), no Sebrae, e reuniu representantes da sociedade civil, academia, governo e empresas. Essa é a primeira etapa do projeto Curitiba 2035, parceria entre a Comunitas , o Sistema Fiep, o Instituto Arapyaú e a Prefeitura de Curitiba.
A ideia do projeto é elaborar um planejamento estratégico para a cidade. Definidos os nove eixos, a próxima fase consiste em reunir entidades e profissionais de cada área para pensar em planos de ação. Em sua reta final, em 2017, o projeto entra em uma fase de “governança”. A ideia é criar estruturas que não só acompanhem as metas, mas também a executem.
Diferente de conferências do controle social, que focam em ações do poder público, o Curitiba 2035 pretende trazer a responsabilidade também para universidades, empresas e órgãos da sociedade civil. As discussões devem ter como base preceitos já estabelecidos para desenvolvimento das cidades. Além da Nova Agenda Urbana, em discussão pelo Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos (ONU-Habitat), devem ser considerados os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) e oCuritiba 2030, elaborado pela Fiep em 2010.
As nove áreas definidas nesta quarta-feira são: Cidade da Educação e do Conhecimento; Coexistência em uma Cidade Global; Desenvolvimento Socioeconômico; Governança; Meio Ambiente; Mobilidade e Transporte; Planejamento e Gestão Urbana ; Saúde e Qualidade de Vida; e Segurança . Em novembro, serão realizados nove painéis temáticos para debater cada uma das áreas. Cada painel deve reunir cerca de 40 especialistas das respectivas áreas. As discussões não são abertas ao público.
Matéria publicada originalmente no jornal Gazeta do Povo.