Evento foi realizado em São Paulo em parceria com Centro Ruth Cardoso
O programa Juntos realizou, na noite desta quinta-feira (15/10), uma roda de propostas de saúde, em que palestrantes abordaram o funcionamento da saúde pública no nível municipal e os principais desafios enfrentados. O evento é uma parceria com o Centro Ruth Cardoso e foi realizado em São Paulo (SP).
A roda de propostas foi o primeiro encontro de uma série de discussões pluripartidárias sobre políticas públicas para as cidades. O objetivo dos encontros é a construção de uma agenda positiva dos programas e propostas dos candidatos às eleições municipais de 2016.
Participaram da roda o ex-ministro da Saúde Barjas Negri, a presidente do Fórum Permanente de Direito à Saúde, desembargadora Vanessa Verdolim Hudson Andrade, o subsecretário de Gestão da Secretaria de Saúde da Prefeitura do Rio de Janeiro, Flávio Alcoforado, a coordenadora de Saúde e Desenvolvimento Social do Viva Rio, Ana Schneider, a professora da Faculdade de Saúde Pública da USP Marilia Louvison, e o superintendente de Logística do Hospital Sírio-Libanês, Rodrigo de Almeida Macedo.
Financiamento
O ex-ministro Barjas Negri falou sobre a situação crítica dos municípios, atualmente prejudicados no financiamento da saúde pública.
“Nos últimos anos, o Ministério da Saúde foi repassando funções e obrigações aos municípios e, hoje, eles estão sobrecarregados. A lei os obriga a gastar 15% de suas receitas em saúde, mas o gasto médio é de 22%”, disse.
Negri reforçou a preocupação com a informação dada há menos de um mês pelo então ministro da Saúde, Arhur Chioro, de que o orçamento do Ministério da Saúde em 2016 não tem recursos previstos para o último trimestre do ano.
“A situação hoje é crítica, nos preocupa muito a situação do próximo ano, agravada pela situação fiscal. Não há caminho fácil a ser tomado”.
A coordenadora de Saúde e Desenvolvimento Social do Viva Rio, Ana Schneider, também abordou o financiamento da saúde pública.
“Há claramente um subfinanciamento da saúde. Precisamos discutir alternativas, como a redistribuição da carga tributária. As iniquidades sociais no Brasil persistem, ainda vivemos com situações de extrema pobreza e difícil acesso, e são nos municípios onde as pessoas vivem”, disse Schneider.
Descentralização
A professora da Marilia Louvison defendeu um maior investimento na saúde básica, desafogando grandes equipamentos e restaurando a confiança de parte da população no Sistema Único de Saúde (SUS).
“Temos que intensificar a aposta na atenção primária, seja em unidades básicas, no programa Saúde da Família, para seduzir a sociedade. Estruturar a classificação de risco no atendimento, fortalecer o atendimento afetivo. Ninguém quer frequentar um posto de saúde mal preparado”, disse a professora.
O subsecretário Flávio Alcoforado falou sobre o atual momento da saúde pública carioca, que apostou no fim da centralização da gestão.
“Para conseguir aumentar o acesso da população, usamos mecanismos de descentralização, como a divisão da cidade em 10 áreas, cada uma com uma coordenadoria na atenção básica”, ressaltou.
Parcerias
O superintendente do Hospital Sírio-Libanês, Rodrigo de Almeida Macedo, abordou temas de preocupação do setor público que são comuns também à saúde privada.
“As pressões demográficas e por inovação tecnológica são comuns às áreas pública e privada. O desafio é fechar a conta com os custos crescentes, e as parcerias podem ser um caminho. Temos que nos voltar à saúde, e não à doença”, destacou Rodrigo.
Ana Schneider também destacou a atuação do Viva Rio no Rio de Janeiro, inclusive em regiões com altos índices de violências.
“Atuamos nas comunidades famosas, da zona sul, mas também na zona norte, onde os profissionais estão constantemente em situação de conflito. Temos uma equipe que vai aos territórios, faz rodas de conversa e dá suporte, além de orientar sobre rotas de fugas”, ressaltou.
Judicialização
A desembargadora do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) Vanessa Verdolim Hudson Andrade, que também preside o Fórum Permanente de Direito à Saúde, falou sobre a judicialização da área.
Segundo ela, as ações judiciais requerendo acesso a tratamentos e medicamentos não fornecidos pelo SUS eram deferidas sem maiores questionamentos, levando-se em conta o artigo 196 da Constituição, que determina que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos […]”.
No entanto, a judicialização cresceu a partir dos anos 2000, causando problemas orçamentários às prefeituras. “Além disso, começamos a ver que a justiça estava sendo usada para furar a fila do SUS e para laboratórios comercializarem medicamentos sem os devidos testes”, afirmou a desembargadora.
A solução adotada pelo TJMG foi um convênio entre a Secretaria de Estado de Saúde e o Núcleo de Avaliação de Tecnologias em Saúde (NATS), ligado ao Hospital das Clinicas e à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
O NATS passou a prestar informações sobre a real necessidade dos pedidos das ações, avaliando a eficácia de medicamentos e a similaridade com os serviços já oferecidos pela rede pública.
“Um levantamento sobre a evolução dos gastos com sentenças judiciais em saúde mostra que, em 2011, o custo em Minas foi de R$ 111 milhões. Em 2013, R$ 328 milhões. Em 2014, R$ 221 milhões, uma redução de 32%, a partir dessa parceria com o NATS”, afirmou a desembargadora.
Universalidade
No encerramento da roda, o questionamento sobre uma eventual cobrança aos usuários que utilizam o SUS gerou a defesa do modelo atual, previsto na Constituição como público e universal.
Os presentes também ressaltaram que, mesmo com limitações e deficiências no atendimento, o sistema público de saúde brasileiro funciona de forma satisfatória em boa parte de suas ações e é exemplo para todo o mundo.